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quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Lembra quando a gente falava de amor?

''Seria antes: o diálogo que nunca houve. Segundo o bruxo Lacan, parece que “quando há diálogo, não há amor” – ou vice-versa. Será? Vou ter de verificar.

A grande ilusão do movimento feminista dos anos 60/70 foi achar que seria possível, esse diálogo. Que o homem também o queria – nem picas! O que ele queria continuar a ter: a mulher fácil, não somente objeto sexual, companheira, mãe dos filhos, etc (já sabemos), mas principalmente o ser calado – aquela que nos séculos passados, por ignorância, medo, comodismo, prestava-se a fingir ser o Ser definido pelo homem. Um Ser inexistente, uma figura fictícia que desempenhava mil papéis e se contentava com eles.

Mas o Ser Calado se desenvolvia na sombra, tentando se desembaraçar sozinha de teias asquerosas. E bordando, linda, meiga, dócil, cabecinha inclinada do lado, no canto que lhe fora assinalado no script. Ao vê-la assim, tão bela e sólida (pensava ele, assegurado), após um beijo perfunctório na testa da companheira o homem punha o chapéu na cabeça e rumava para o clube – para conversar com os amigos homens, o brother, o parceiro de competições intelectuais, o suporte emocional na hora da bebedeira tribal.

(Nunca, nesse momento do beijo perfunctório, ele – inocente! – lançou um olhar mais atento ao: bordado. Ao risco desse bordado. Que era ainda, preservado e eternamente feito desfeito refeito, aquele mesmo que o narcisista Ulisses também não se preocupara em verificar, por sobre o ombro de sua Penélope.

A grande pergunta do questionamento homem/mulher: qual era o risco do bordado de Penélope?

A grande pergunta até hoje nem suficientemente colocada.''

Cecília Prada

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